domingo, 26 de julho de 2009

Degustador
















Soube da existência de um degustador que exibia seu talento para um pequeno grupo, depois de receber uma quantia específica em dinheiro, depositada antecipadamente.
Não estava interessado nesse tipo de espetáculo, muitas vezes pura charlatanice. Mas ao saber sobre alguns detalhes, mudei de idéia.
Nos primeiros dias, posso dizer que me senti indiferente. Porém, os cinco dias que anteciparam a sexta-feira, foram de extremo anseio. Na sexta desmarquei todos meus compromissos, meu descontrole era terrível. Minhas mãos transpiravam em excesso, junto de todo meu corpo.
Para o tempo passar, tentei alguns filmes, não consegui me concentrar. As horas foram passando, o sofrimento que estava sentindo era tanto que cheguei a cogitar o suicídio.

Às seis horas passei em frente do endereço. Estava duas horas adiantado. Olhei algumas vezes para o número anotado no papel e para o número fixado no muro da casa. Não havia erro. Por sorte, consegui achar um bar no próprio bairro, pedi apenas uma dose de uísque. Queria estar sóbrio, atento a todos os gestos do degustador.
O dono do bar, ao ver que eu me diferenciava dos freqüentadores de costume, pelos meus trajes e comportamento, veio me oferecer o cardápio. Recusei. Gosto de escolher a comida sentindo o cheiro, vendo a consistência, e todos os outros detalhes.
“Traga todos os pratos” disse.
É desnecessário dizer que olhava para o relógio em intervalos de poucos segundos.
Às sete e trinta, os pratos começaram a aflorar do balcão. Paguei minha conta. Quando saia, o dono do bar veio me perguntar porque eu não provara nenhum dos pratos. Não respondi, continuei andando com ele atrás. Enquanto entrava no carro, ele continuou a perguntar. A satisfação que me deu aquele homem humilde tentando fazer contato, e eu repelindo-o, me fez esquecer por alguns segundos do degustador. Desde o começo tinha total consciência de que não provaria a comida do bar, contudo precisava marcar meu território através da exuberância.

Ainda que meu carro possua alarme, estacionei-o em frente da casa, assim poderia vigiá-lo de vez em quando pela janela.
Toquei a campainha e uma velha veio abrir a porta. Me conduziu até a sala, onde havia mais oito pessoas. Ficamos todos em silêncio. Alguns minutos depois ouvi a campainha, a velha trouxe para a sala um casal que veio inteirar o grupo.
Um homem aparentando ter cinqüenta anos, surgiu por um corredor. Usava uma camisa desbotada pelo tempo e uma calça social no mesmo estado. Então era esse o degustador.
Com a ajuda de alguns cavalheiros consegui chegar até a janela, não se preocupem, era apenas uma falta de ar. Aproveitei para olhar o carro. Que grande decepção, o degustador aparentava ser um circense.
A velha voltou pelo mesmo corredor que o circense apareceu, pediu para que nos sentássemos, apontando as cadeiras de metal que formavam um círculo em volta do circense ou degustador, como preferir.
O degustador sentou-se também, à sua frente uma pequena mesa forrada com jornal aparava três recipientes de metal cromado. Abriu os três, quase que simultaneamente. Revelando para a pequena platéia o que ocultava.
Servindo-se de pequenos pedaços com a colher, degustou as fezes. Terminou de comer e a sessão foi encerrada. A velha acompanhou-nos até a porta, fomos todos em silêncio.
Com a mente desprovida de qualquer pensamento a não ser o de dirigir, fui até a praia. Fiquei encarando o mar por algumas horas, depois levantei e gritei com toda força enquanto chutava o ar e a areia.

Um comentário:

  1. ele mereceu, após ter tratado daquela forma o dono do bar. bizaaaaaarro o conto.

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