terça-feira, 21 de julho de 2009

Chefe de Família


Depois de jantarmos me levantei, ia para o quarto quando ela disse que queria conversar. Tenho meu ritual pós jantar, gosto de deitar, ouvir Waldstein de Beethoven, com Janus Jandò tocando piano e expelir os gazes lentamente. Vou ao banheiro, fecho a janela e tomo um banho com a água quase fervendo, me enxugo no vapor. Mais tarde um calmante e oito horas de sono. Esses são os poucos prazeres que desenvolvi para conseguir suportar os dias na empresa.
Sentamos no sofá novo. Depois que fui promovido para presidente, comprei uma serra elétrica com o pretexto de cortar alguns galhos das arvores no quintal. Em uma sexta-feira cheguei mais cedo em casa, dispensei os empregados e passei a serra no velho sofá. Fui até a loja e comprei o mais caro, simulei naturalidade para o vendedor, fingindo não olhar o preço. Também comprei alguns tapetes novos e redecorei a casa.
Estou grávida, disse ela. Disse também que sabia que eu não queria filhos, iria morar com a mãe mas não tirava a criança por nada. Fiquei em silêncio sem demonstrar emoção. Aprendi que quando não sabemos o que fazer, devemos manter nosso rosto sem expressões.
Abracei-a com força, tirei-a para dançar ali na sala, ao som das nossas risadas. Em seguida falei “Espere aqui, tenho um presente para essa ocasião.” Tenho sempre presentes escondidos no meu closet para cada ocasião, mulheres não gostam de palavras.
Sentado na cama abri a caixa de madeira escura, revestida de veludo.
Voltei para a sala, sorri e disparei três balas. Duas para ela e uma para a criança. Como eu disse, tenho sempre um presente para cada ocasião.

2 comentários:

  1. O rei das descrições,
    realmente um presente inesperado,
    e o instito paterno o fez reservar
    uma bala para a futura cria!
    Bela lembrança!

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  2. não aprovo estes gestos de crueldade contra as grávidas. e minha avó aconselhava a não tomar banho após as refeições...
    mas o título é bom.

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